Tinha por hábito lanchar no Atrium do Saldanha por ter a academia de dança ali perto e pelos concertos de piano que existem ao fim da tarde. O piano foi algo que cresceu nos meus gostos com a prática do Ballet e, hoje em dia, é meio caminho andado para me pôr a sonhar acordada. Mudei de academia mas, de vez em quando, gosto de voltar ao hábito. Foi o que fiz ontem.
Uma das coisas que reparo sempre é nas pessoas, no que vestem, como andam. Há sítios que são mais propícios a isso e o Atrium é um palco de gente descontraída e, pelo oposto, de uma enorme quantidade de profissionais, que se apresentam muito formais, das diversas consultoras ali instaladas.
As mulheres chamam sempre mais a minha atenção. Cores escuras que não variam para lá do cinza, do azul escuro e do preto, linhas direitas e enfadonhas nas roupas, quase masculinas, sabrinas ou grandes saltos, ombros caídos, ar pesado e cansado, todas muito indistintas, sendo a maior parte delas muito novas.
Não tenho saudades nenhumas dos tempos em que de Segunda a Sexta-feira, o dress code que me era imposto era precisamente esse, sem espaço para saias sem collants ou sandálias de dedos de fora. Hoje em dia, as coisas estão mais flexíveis mas, com regras mais rígidas ou menos rígidas, acredito que a maioria caia nessa fórmula por ser mais fácil, rápida e dificilmente errada.
O revés? Nota-se no rosto e nos ombros. Entranha-se na pele e na forma de estar. Ausência de personalidade e vivacidade. Os pés arrastam os saltos vertiginosos a custo ou as sabrinas como chinelos. Tornam-se indistintas.
Um exercício mental que me diverte bastante é olhar para cada uma delas e mudar um ponto ou outro (ou vesti-la da cabeça aos pés), sem lhe retirar o ar profissional, alterando e acrescentando o suficiente para que a sua personalidade desabroche e coexista.
Por várias vezes, apeteceu-me abordar uma ou outra e dizer-lhe que a acompanharia de bom grado numa sessão de compras. Tanta mulher com potencial e quase todas tão apagadas, que até doí a alma.
Por vezes é preciso arriscar um pouco. Começar devagar mas essas mudanças são muito importantes. Não podemos esquecer que passamos a maior parte do tempo naquelas roupas e é bom que elas nos façam sentir como se fossem uma segunda pele. Cuidada, que seja o nosso espelho. Além do mais, isso também é importante profissionalmente. Um pouco de personalidade só faz bem. Destaca-nos dos colegas, chama a atenção do cliente. Tal como um homem bem vestido e com boas peças leva um cliente a pensar que ele é bem sucedido, uma mulher arranjada com personalidade faz o mesmo. As outras tornam-se invisíveis.
Bem sei que estamos em Portugal, que o papel da mulher no trabalho ainda não é visto da mesma forma que o do homem e por isso muitas anulam a sua feminilidade, em troca de igual aceitação, mas passar a maior parte da vida no cinzento não é forma de vida. Não conquista nada. Torna-nos em mais um número. Por mais fútil que possam achar este assunto, as roupas podem fazer muito. Não só ao nosso aspecto exterior, como à nossa auto-estima, segurança, afirmação. Tudo isso reverte-se no trabalho, na forma de estar e na vida pessoal.
Daí que, a partir de agora, gostaria de propor visuais para trabalho que fujam ao básico. Para já, não em mim, que não tenho jeito para modelo e muito menos tenho um(a) fotógrafo(a) sempre disponível, mas recolhendo sugestões, fotos, ou fazendo conjuntos que considere interessantes.
Quanto às meninas das consultoras, advogadas, economistas, gestoras, executivas, todas as que entrem neste espectro, quem sabe, um dia, faça isso. Tome a iniciativa de vos dizer "Vamos às compras." Sem que me tomem por louca, naturalmente. Esta é muito a minha praia e já tive todas essas dores. Diferenciar não é fácil mas torna tudo tão mais interessante.